Aprovada na Câmara dos Deputados por ampla margem de votos na quinta-feira (14/9), a minirreforma eleitoral foi apresentada com o objetivo de ajustar e simplificar as regras eleitorais. No entanto, não escapou de críticas de especialistas e parlamentares por conter “pegadinhas” que podem, na prática, flexibilizar a Lei da Ficha Limpa, modificar a prestação de contas de candidatos e partidos e restringir punições às legendas que, por exemplo, não cumprirem as regras de cota para candidaturas femininas.
Duas propostas compõem a minirreforma eleitoral: um projeto de lei e outro de lei complementar, esse último elaborado para tratar especialmente de mudanças relacionadas às regras de inelegibilidade. Os textos foram construídos em um grupo de trabalho e discutidos com líderes partidários em reuniões fechadas.
Ao defender o texto, o relator do projeto, Rubens Pereira Júnior (PT-MA), afirmou que o objetivo é modernizar as regras eleitorais, dando a oportunidade à Justiça Eleitoral de se concentrar em combater crimes como boca de urna e compra de votos.
“Nós tivemos um grande avanço nesta semana, com a aprovação da minirreforma eleitoral, que consolida o sistema político eleitoral brasileiro, que moderniza, que simplifica, que dá transparência, que vem, sem dúvida alguma, fortalecer a democracia brasileira”, afirmou.
Ao todo, foram apresentadas 45 emendas ao texto; no entanto, no geral, a proposta sugerida pelo relator foi mantida.
Confira os principais pontos da minirreforma eleitoral:
• Inelegibilidade
Um dos pontos mais polêmicos da minirreforma eleitoral tem a ver com o novo prazo de inelegibilidade de políticos que perdem o mandato, o que altera a Lei da Ficha Limpa. Pelo texto aprovado, a inelegibilidade de oito anos contaria a partir da perda do mandato.
A regra vai valer para os parlamentares que forem alvo de impeachment ou de processo por quebra de decoro parlamentar.
Atualmente, a inelegibilidade conta durante o cumprimento da pena e por mais oito anos. Com o novo texto, ficariam inelegíveis nos oito anos após a data da condenação.
• Candidaturas coletivas
Durante a votação no plenário, os deputados retiraram do texto o trecho que regulamentava as candidaturas coletivas para deputados e vereadores. Com a decisão de proibir a modalidade, o plenário invalidou uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de dezembro de 2021, que disciplinou a possibilidade de candidatura conjunta.
A candidatura coletiva ocorre quando um grupo se une para “dividir” uma vaga no Legislativo. Em vez de votar em apenas uma pessoa para o cargo, é possível votar no coletivo. Nas eleições de 2022, foram 213 coletivos de candidatura inscritos na disputa.
• Propaganda eleitoral
Acaba com a exigência de tamanho da propaganda eleitoral em carro e disciplina a propaganda conjunta de candidatos. O texto também permite a propaganda conjunta de candidatos de partidos diferentes, independentemente de estarem coligados ou integrarem a mesma federação. Ficou vedado o repasse de recursos financeiros entre candidatos.
• Pix
Dispensa os candidatos de informar à Justiça Eleitoral as doações recebidas por Pix ou similar. Essa obrigação passa a ser dos bancos, em vez de ser dos partidos. A proposta também elimina o recibo eleitoral e a prestação de contas parcial.
• Registro de candidatura
Antecipa em dez dias o período de convenções partidárias. Com isso, os partidos devem registrar candidatos de 26 de julho a 31 de julho do ano da eleição. A proposta também altera o prazo de julgamento dos registros de candidatura para cinco dias antes da eleição. O texto ainda prevê o retorno imediato dos servidores públicos efetivos que se licenciarem para concorrer a cargo eletivo.
• Financiamento de campanhas
Prevê a utilização de recursos do fundo partidário para a contratação de serviços de segurança, desde o período das convenções até a data da eleição. Despesas com segurança pessoal, hospedagem, aluguel de carro, avião e barco, além da alimentação do candidato, também poderão ser pagas com o fundo partidário.
• Violência política contra a mulher
Amplia o rol de vítimas da violência política e define as condutas que caracterizam fraude à cota de sexo nas candidaturas. O texto aprovado também elenca condutas que podem ser caracterizadas como fraude à reserva de recursos e campanha para mulheres. Pelo texto, são considerados abuso de poder político a não realização de atos de campanha e número de votos que revele “não ter havido esforço de campanha, com resultado insignificante”.
Apesar disso, o texto é mais brando do que o divulgado inicialmente. Pela proposta original, também seria considerada fraude à cota de gênero a falta de repasses financeiros às campanhas de candidatas mulheres. Esse trecho acabou suprimido do projeto aprovado no plenário.
• Pesquisas eleitorais
Amplia o período de publicação de levantamentos para desde a convenção, em vez de apenas no período de campanha.
• Distribuição de sobras
O principal ponto de discussão foi a alteração da regra das sobras nas eleições de deputados e vereadores. O texto altera o cálculo das vagas que não são preenchidas a partir da relação entre os votos dos partidos e o número de cadeiras (quociente eleitoral e quociente partidário). Hoje, legendas com 80% do quociente podem eleger candidatos pelas sobras. Pela proposta aprovada, será exigido que o partido obtenha 100% do quociente eleitoral, e o candidato, 10%.
• Desincompatibilização eleitoral
A proposta também muda as regras de desincompatibilização eleitoral, que é a ação em que ocupantes de cargos no serviço público se afastam de posto, emprego ou função na administração pública direta ou indireta para poder se candidatar a um cargo eletivo. Isso para evitar que haja abuso de poder econômico ou político por meio do uso da estrutura e de recursos aos quais o servidor tem acesso.
Atualmente, o prazo para desincompatibilização de servidores efetivos ou comissionados é de três meses. Porém, nos casos em que há função de chefia, o afastamento deve ocorrer com antecedência de seis meses do pleito.
Pelo novo texto, o prazo fica unificado em seis meses antes da data da eleição. Além disso, a lei prevê que os servidores públicos que não se licenciarem para concorrer a cargo eletivo, mas que não tiverem a candidatura apresentada por partido político ou tiverem a candidatura indeferida, devem voltar imediatamente às suas funções, sob pena de serem responsabilizados administrativamente.
Análise no Senado
O próximo passo para a validação da minirreforma eleitoral é a aprovação no Senado. Para que as regras possam ser aplicadas nas eleições municipais de 2024, os dois projetos precisam ser sancionados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) até 6 de outubro.
No entanto, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), demonstrou que não tem pressa para tratar do assunto. Nesta quinta (14), ele disse que a proposta deve ser anexada a um outro projeto, que trata do novo Código Eleitoral e que está em debate na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
“É complexo. Temos que avaliar se é possível fazer isso em duas semanas. Não podemos produzir uma legislação na pressa. Vamos analisar se o todo ou se parte poderá ser analisada ainda em setembro. Não haverá nenhum açodamento”, disse.
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