Sensível. Transparente. Belo. Num ritmo lento, com imagens belíssimas das paisagens de Bonito, Dourados e Maracaju, o filme “Madalena” foi exibido na noite desta quarta-feira (9), no MIS (Museu da Imagem e do Som), em sessão extra de fim de ano.
O primeiro longa-metragem de ficção de Madiano Marcheti tem como ponto de partida o corpo de Madalena, encontrado em uma plantação de soja. Na sequência a trama acompanha a história de três jovens – Luziane (Natália Mazarim), Bianca (Pamella Yule) e Cristiano (Rafael de Bona), que vivem contextos diferentes em uma mesma cidade. Embora não se conheçam, o espírito de Madalena que esvoaça sobre a cidade, torna-se um elo entre os três. O longa denuncia a violência constante do país que mais mata a população LGBTQIA+.
A atriz Chloe Milan, que fez o papel de Madalena, disse que o seu personagem foi “um presente”. “É muito gratificante trazer essa história para o público, retratar a nossa história como mulher. Mostra a realidade que a mulher trans enfrenta todos os dias. Eu trabalho durante o dia, tenho uma vivência diurna. Claro que o preconceito existe, mas se a gente não der a cara a tapa não vamos servir de exemplo para as outras. Aos poucos a gente vai seguindo”.
A atriz Natalia Mazarim, que fez o papel da “Luziane”, uma das protagonistas, também esteve presente na exibição do filme no MIS. “A Luziane é uma menina que vive numa cidade no interior do Centro-Oeste, que faz vários bicos para sobreviver. Ela se relaciona com a Madalena, a personagem principal, por meio de um trabalho que sua mãe fez para ela. A Luziane sente essa falta da Madalena mas não faz nada a respeito do sumiço. Esta omissão Cis é o que mata. O filme mostra o quanto a monocultura da soja impacta na economia, não há diversidade ecológica. Esta monocultura também se refere ao que é ‘mono’, uma indiferença, uma falta de empatia ao que é ‘multi’, à falta de solidariedade e aceitação ao que é diverso”. Cisgênero (Cis) é o termo utilizado para se referir ao indivíduo que se identifica, em todos os aspectos, com o seu “gênero de nascença”. Em outras palavras: na pessoa cisgênero existe concordância entre a identidade de gênero (a forma como a pessoa se vê) e o gênero que lhe foi conferido ao nascer.
Para Natália, é “muito incrível” uma produção como “Madalena” ter sido produzida num período de escassez de incentivos culturais e da atual política nacional que o país enfrenta. “É uma vitória esse filme sair nesse contexto atual. Muito significativo isso. Existia uma tensão muito grande por conta das eleições, em 2018, época em que o filme foi feito. Sofremos represália por um grupo local por conta da temática do filme. E ter um elenco regional é um ponto forte do filme. Aqui temos atores, estamos aqui e somos tão competentes quanto os artistas do Sudeste do Brasil”.
Os atores, produtor cultural e dramaturgo Marcelo Leite e Edner Gustavo vieram conferir no MIS o lançamento do filme. Eles acompanham o diretor Madiano Marcheti nas redes sociais e se interessaram pela produção. “Ontem mostraram o trailer do filme, ficamos com muita vontade de ver. Estamos orgulhosos por ser uma produção local e que está viajando o mundo, está sendo premiado. É super importante nesse momento em que estamos vivendo abordar este tema do filme e colocar como protagonista uma mulher trans. Aqui nunca assistimos a um suspense que tenha uma pegada assim”.
Para a coordenadora do Museu da Imagem e do Som, Marinete Pinheiro, é muito gratificante abrir o espaço do museu para a exibição de um filme produzido aqui. “A gente sempre foi um espaço de lançamento. Tivemos um contato com a distribuidora do longa metragem, a Vitrine, que fez o pedido, que vai ao encontro da proposta do MIS. Aí decidimos fazer essa experiência de reabrir à noite, as pessoas estão perguntando sobre a possibilidade de reabertura do museu. Acredito que as atividades recomecem pra valer no próximo ano”.