A fronteira de Ponta Porã com Pedro Juan Caballero, atraiu, ao longo de décadas, migrantes dos mais diversos lugares. Entre os grupos numerosos que se estabeleceram na região, estão os japoneses que trocaram o continente asiático pelo Paraguai.
O início da imigração japonesa para o Departamento de Amambay, especialmente à sua capital, Pedro Juan Caballero, completou 64 anos, ontem,no dia 23 de maio. Os primeiros grupos totalizaram 1001 pessoas. Foram oito grupos que chegaram na metade do século passado.
De acordo com um estudo feito historiador e jornalista Nivalcir Almeida, o primeiro grupo chegou no dia 23 de maio de 1956. Desembarcou na Estação Ferroviária de Ponta Porã, cruzando rapidamente a fronteira, indo se estabelecer na propriedade da empresa CAFE, responsável pela produção de café numa enorme extensão de terra. Eram 38 famílias, com 260 membros, que saíram do Japão no dia 3 de abril daquele ano. Algumas pessoas que formaram o grupo ainda vivem na fronteira.
A CAFE era uma empresa de cujo responsável, “Señor” Johnson, norte-americano, desenvolvia a produção de café, uma atividade que necessitava de grande volume de trabalhadores. Por isso, as famílias japonesas foram atraídas para cruzar o mundo, vindo se estabelecer no lado paraguaio da fronteira. A vinda do Japão era de navio e a viagem terminava no Porto de Santos. De lá, até Ponta Porã, as famílias viajaram de trem. Chegaram à fronteira através da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, cujo trecho até a fronteira tinha sido inaugurado recentemente. De acordo com as informações colhidas pelo historiador, o navio que os trouxe do Japão chamava-se Africa Maru. “Estas informações foram coletadas junto à senhora Hiroko Oishi, numa visita que fiz à Associação Japonesa de Amambay, onde ela atuava como secretária geral da entidade que reúne os descendentes dos japoneses na fronteira. Aliás, uma entidade bastante participativa pois o grupo é numeroso e sempre promove atividades culturais”, relata Nivalcir.
O segundo grupo veio em 17 de julho do mesmo ano. Eram 16 famílias, com 129 pessoas. No ano seguinte, chegaram mais 18 pessoas. A crise econômica no Japão, fez com que muitas famílias deixassem o país para buscar melhores condições de vida. Para o continente sulamericano vieram milhares de japoneses, antes e depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). “Segundo relato da senhora Hiroko, no Japão havia pouca terra para que as famílias de agricultores pudessem produzir e se sustentar. O jeito era buscar um lugar em que fosse possível trabalhar, produzir e viver com dignidade”, explica o historiador. O Brasil e o Paraguai foram lugares escolhidos. “A opção pela fronteira se deu pelo potencial agrícola da época, quando estava se iniciando a produção de café. As pessoas diziam que o café era ouro que dava em árvore. Por isso, muitos japoneses foram atraídos e decidiram vir conhecer a árvore que dava ouro”.
A exemplo do primeiro grupo de japoneses que desembarcou no Brasil em 1908 para trabalhar nas plantações de café do interior de São Paulo, os imigrantes que escolheram a fronteira do Paraguai com o Mato Grosso do Sul para morar, tinham o sonho de enriquecer por conta do trabalho nos cafezais: “Eles ouviam uma propaganda muito positiva da produção de café. Diziam que aqui tinha ‘árvore que dava ouro’. O ouro seria o café. Então, juntavam o que tinham, e embarcavam em direção ao continente americano. Quem contratava os japoneses queria que eles viessem em famílias numerosas. Que tivesse no mínimo quatro pessoas, pois o trabalho nos cafezais exige grande quantidade de trabalhadores, relatou-me a dirigente da entidade no meu trabalho de pesquisa”, expõe Nivalcir.
Segundo ele, no primeiro grupo, a média era de 6,8 pessoas por família. O quarto grupo chegou à fronteira em 17 de agosto de 1957. Eram 20 famílias mais dois solteiros, totalizando 121 pessoas. No mês de outubro daquele ano, chegaram mais 21 famílias, com 138 pessoas. No mês seguinte, desembarcaram na fronteira mais 10 famílias com 71 componentes. No ano seguinte, no dia 23 de março de 1958, chegou o sétimo grupo de japoneses, com 67 pessoas distribuídas em 11 famílias. E, no ano seguinte, exatamente no dia 23 de maio de 1958, cegou a última turma, com 104 pessoas, de 19 famílias. No total, foram 908 famílias entre os anos de 1956 e 1958.
Nos anos seguintes continuaram chegando mais japoneses. Hiroko Oishi veio num grupo que chegou ao Paraguai em 1966. “Quando a entrevistei, ela me disse que tinha 11 anos quando deixou o Japão e veio para a fronteira do Brasil com o Paraguai. Ao contrário dos demais japoneses, o grupo de Hiroko desembarcou primeiro no Paraguai vindo da Argentina. Até o ano de 1992, quando se registrou a chegada do último imigrante japonês, foram 1.001 pessoas que deixaram o Japão para trabalhar na fronteira”.
Parte do trabalho de pesquisa foi publicada numa matéria no extinto Jornal Regional, de Ponta Porã. Na matéria, publicada em maio de 2014, o historiador e jornalista expôs que, num primeiro momento, a principal atividade desenvolvida pelos japoneses na fronteira era a agricultura.
MUDANÇAS
“A presença dos japoneses na fronteira garantiu a introdução de muitos costumes que foram absorvidos pela comunidade local. Uma das principais características desta integração com os fronteiriços foi na alimentação. Os primeiros japoneses introduziram o cultivo de verduras e alguns legumes nesta região. Antigamente, no meio das lavouras de café, no espaço entre as plantas, era possível produzir hortaliças. A acelga era uma delas. Eles eram agricultores no Japão e, muitos trouxeram sementes, que plantaram aqui. Depois que a CAFE deixou de existir, cada família partiu para um tipo de atividade. A maioria preferiu o comércio. Hoje, 80% dos descendentes de japoneses trabalham nos diversos ramos do comércio. Também teve gente que preferiu a indústria da madeira ou continuar na agricultura”.
“Muitos chegaram bem novos aqui. Dona Hiroko, por exemplo, veio para cá ainda na adolescência. Aqui casou-se, constituiu família e se tornou mãe quatro vezes. Quando a conheci e entrevistei, ela relatou que possuía três netos. Ela me disse que vários japoneses que vieram para cá decidiram morar no Brasil. Muitos foram para São Paulo depois que não deu certo a produção de café. Alguns imigrantes estão vivos e moram por aqui. Devem ser mais de 400 os descendentes espalhados pela fronteira”, acredita.